Este é um espaço para a reflexão de temas que em algum momento e por alguma razão (do meu contexto pessoal ou da minha prática clinica) se tornaram, usando uma expressão gestáltica, importantes FIGURAS no imenso FUNDO existencial.

12 de novembro de 2012

O trabalho com a sombra

  

“Cada ser é uma flor a desabrochar sob a luz da consciência do outro” 
                                                                                             (Paule Salomon)

    Na psicoterapia de base junguiana o primeiro passo dado no processo de ampliação da consciência é o estabelecimento do contato com a persona e com a sombra.
   O simples fato de reconhecermos o uso de máscaras sociais, chamadas por Jung de persona, nos conduz à importante ideia de que há muita coisa por de trás delas, muita coisa que queremos ou aprendemos que devemos ocultar em nome da adaptação social. Os aspectos reprimidos em prol da aceitação compõem o que Jung chamou de sombra.
  Se por um lado, "só se alcança o objetivo social com sacrifício da totalidade da personalidade" (Jung, A Natureza da Pique, p. 344); por outro, tudo aquilo que foi sacrificado e reprimido não deixa simplesmente de existir. A sombra, continua atuando em nossas vidas de forma inconsciente.
"São muitos - muitíssimos - os aspectos da vida que poderiam ser igualmente vividos, mas jazem no depósito de velharias, em meio a lembranças recobertas de pó; muitas vezes, no entanto, são brasas que continuam acesas por debaixo de cinzas amarelecidas" (Jung, A Natureza da Pique, p. 344).
   Persona e sombra guardam entre si uma estreita relação e no livro “Jung. O Mapa da Alma”, Murray Stein explica muito bem essa importante vinculação:


“A sombra e a persona são ‘pessoas’ estranhas ao ego que habitam a psique junto com a personalidade consciente que nós próprios sabemos ser. Há a ‘pessoa pública’ e oficial a que Jung chamou de persona, a qual está mais ou menos identificada com a consciência do ego e forma a identidade psicossocial do indivíduo. E, no entanto, é também, tal como a sombra, alheia ao ego, embora o ego se sinta mais à vontade com a persona pelo fato de ela ser compatível com normas e costumes sociais. A personalidade da sombra não está visível e só aparece em ocasiões especiais. O mundo ignora, em maior ou menor grau, a existência dessa pessoa. A persona está muito mais em evidência. Ela desempenha um papel oficial, cotidiano, de adaptação ao mundo social. Sombra e persona são como dois irmãos (...); uma está à vista do público, a outra está escondida e é solitária. São um estudo em contraste. Se uma é loira, a outra é morena; se uma é racional, a outra é emocional. (...) Uma complementa, ou, mais frequentemente, opõe-se à outra. Persona e sombra são usualmente o oposto mais ou menos exato da outra e, no entanto, são tão chegadas quanto o podem ser dois gêmeos” (p.100).

    Como o ego se sente mais à vontade com a persona e ela pode nos oferecer uma ideia mais ou menos precisa do que está oculto na sombra, é com ela que normalmente começamos o trabalho de autoconhecimento. O primeiro desafio é a desidentificação com persona, ou seja, a conscientização de que somos mais do que um "papel social" (advogado, analista, professor) ou um papel sexual (mãe, pai). É a compreensão de que somos muito mais do que aquilo que socialmente nos foi imposto, exigido ou por nós escolhido. O confronto com esta verdade abre espaço para o confronto com aquelas porções reprimidas e inconscientes, os aspectos sombrios de nossa personalidade, características/desejos/tendências que tiveram que permanecer "na sombra", na ausência da luz da consciência.
   Mas esse trabalho de conscientização do que foi "colocamos por debaixo do tapete", apesar de extremamente necessário para a restauração da totalidade da personalidade, não é simples, nem prazeroso. Resistir ao contato com o nosso lado escuro é quase que inevitável, pois a negação do nosso “eu inferior” é diretamente proporcional ao medo que temos da aniquilação, da rejeição e da perda do amor por parte daqueles que consideramos.
   A crença que subjaz a esta relutância é a de que nossa reputação e auto-estima sofrerão um golpe mortal caso os fatos verdadeiros - embora ocutos e negligenciados - de nós mesmos sejam reconhecidos. De fato poderemos sair do confronto com nossas verdades desagradáveis com uma sensação de derrotada e a acorrência dessas situações de desespero e fracasso são melhor explicadas no post "Estou me sentindo tão mal, desprezível, miserável'" - O contato errôneo e nocivo com a sombra.
  O importante é entender que sabotamos o nosso crescimento quando nos filiamos à ideia de que é muito alto o preço a ser pago pelo reconhecimento dos aspectos que são contrários ao nosso eu psicossocial. Mas na verdade, o preço da negação é que é exorbitante; ela nos impede de crescer e nos enclausura numa experiência rígida e unilateral da realidade (tanto interna quando externa).
   Por ser a sombra uma porção desconhecida, por ser bastante desagradável reconhecê-la como pertencente a nossa personalidade e por serem poderosas as defesas do eu contra a sua conscientização, não é fácil acessá-la via introspecção. O processo de reflexão sobre o que nos ocorre intimamente, a observação e descrição dos nossos conteúdos internos - pensamentos e sentimentos - nos conduzem apenas até um certo ponto, que é bem limitado. 
   Como salientado na epígrafe desse texto, somos como uma espécie de flor a desabrochar sob a luz da consciência do outro. O que significa afirmar que a única forma de adquirimos um conhecimento aprofundado sobre nós mesmos, e principalmente sobre o nosso lado obscuro, é através do olhar do outro. Seja o analista, que pode ajudar, de forma segura e saudável, no processo de contato e conscientização da sombra; ou pessoas do nosso convívio, que, de uma forma ou de outra, estão sempre nos dando importantes feedbacks.
   Assim sendo, o exercício de perguntar a alguém, que tenha anos de estreita convivência conosco, sobre suas sinceras impressões ao nosso respeito é uma investida mais eficiente do que a autoanálise ou a introspecção. 
   Refletir sobre aqueles que nos incomodam intensamente também é uma forma de, através do outro, nos conhecermos melhor. Como propõe Whitmont (e sugiro que o experimento seja feito não com um amigo, mas consigo próprio): 

 “Peça para um amigo lhe descrever o tipo de personalidade que ele acha mais desprezível, mais insuportável, mais odiosa e de convívio mais impossível; ele descreverá as suas próprias características reprimidas – uma autodescrição que é absolutamente inconsciente e que, portanto, sempre o tortura quando ele recebe seu efeito de uma outra pessoa. Essas mesmas qualidades são tão inaceitáveis para ele precisamente porque elas representam o seu lado reprimido; só achamos impossível aceitar nos outros aquilo que não conseguimos aceitar em nós mesmo. Qualidades negativas que não nos incomodam de modo intenso ou que achamos relativamente fácil de perdoar – se é que precisamos perdoá-las – em geral não pertencem à nossa sombra” (Ao encontro da sombra, p.36).

   Certamente encontraremos um material muito interessante se nos aventuramos a descrever o tipo de personalidade que mais nos incomoda. Esta pessoa, inevitavelmente, refletirá a imagem que não queremos ver quando nos olhamos no espelho em busca apenas da persona e de tudo aquilo que queríamos ou deveríamos ser... 
      Essa breve reflexão sobre o importante trabalho a ser desenvolvido com sombra e a persona pode ganhar um sentido mais concreto com as palavras de Gibran:

"Um dia, muito antes de muitos deuses terem nascido,
despertei de um sono profundo e notei que todas as minhas máscaras tinham sido roubadas
– as sete máscaras que eu havia confeccionado e usado em sete vidas –
e corri sem máscara pelas ruas cheias de gente gritando:
 “Ladrões, ladrões, malditos ladrões!”
Homens e mulheres riram de mim e alguns correram para casa, com medo de mim.
E quando cheguei à praça do mercado, um garoto trepado no telhado de uma casa gritou:
“É um louco!” 
Olhei para cima, para vê-lo.
E então o sol beijou pela primeira vez minha face nua.
Pela primeira vez, o sol beijava minha face nua,
e minha alma inflamou-se de amor pelo sol,
e não desejei mais minhas máscaras.
E, como num transe, gritei: 
“Benditos, benditos os ladrões que roubaram minhas máscaras!”
Assim tornei-me louco.
E encontrei tanto liberdade como segurança
em minha loucura: a liberdade da solidão
e a segurança de não ser compreendido,
pois aquele que nos compreende
escraviza alguma coisa em nós".

Gibran Khalil Gibran



3 de novembro de 2012

Sobre a Transitoriedade

Belíssimo texto de Freud (1916/1915), retirado do vol XIV das Obras Completas – Ed. Imago, para refletirmos sobre a transitoriedade da vida e sobre a inevitável participação de Cronos e Kairos, os deuses gregos do tempo...com os quais, como canta Caetano, devemos entrar em acordo para que possamos ser dignos do prazer legítimo...


   Não faz muito tempo empreendi, num dia de verão, uma caminhada através de campos sorridentes na companhia de um amigo taciturno e de um poeta jovem mas já famoso. O poeta admirava a beleza do cenário à nossa volta, mas não extraía disso qualquer alegria. Perturbava-o o pensamento de que toda aquela beleza estava fadada à extinção, de que desapareceria quando sobreviesse o inverno, como toda a beleza humana e toda a beleza e esplendor que os homens criaram ou poderão criar. Tudo aquilo que, em outra circunstância, ele teria amado e admirado, pareceu-lhe despojado de seu valor por estar fadado à transitoriedade.
   A propensão de tudo que é belo e perfeito à decadência, pode, como sabemos, dar margem a dois impulsos diferentes na mente. Um leva ao penoso desalento sentido pelo jovem poeta, ao passo que o outro conduz à rebelião contra o fato consumado. Não! É impossível que toda essa beleza da Natureza e da Arte, do mundo de nossas sensações e do mundo externo, realmente venha a se desfazer em nada. Seria por demais insensato, por demais pretensioso acreditar nisso. De uma maneira ou de outra essa beleza deve ser capaz de persistir e de escapar a todos os poderes de destruição.
   Mas essa exigência de imortalidade, por ser tão obviamente um produto dos nossos desejos, não pode reivindicar seu direito à realidade; o que é penoso pode, não obstante, ser verdadeiro. Não vi como discutir a transitoriedade de todas as coisas, nem pude insistir numa exceção em favor do que é belo e perfeito. Não deixei, porém, de discutir o ponto de vista pessimista do poeta de que a transitoriedade do que é belo implica uma perda de seu valor.
   Pelo contrário, implica um aumento! O valor da transitoriedade é o valor da escassez no tempo. A limitação da possibilidade de uma fruição eleva o valor dessa fruição. Era incompreensível, declarei, que o pensamento sobre a transitoriedade da beleza interferisse na alegria que dela derivamos. Quanto à beleza da Natureza, cada vez que é destruída pelo inverno, retorna no ano seguinte, do modo que, em relação à duração de nossas vidas, ela pode de fato ser considerada eterna. A beleza da forma e da face humana desaparece para sempre no decorrer de nossas próprias vidas; sua evanescência, porém, apenas lhes empresta renovado encanto. Um flor que dura apenas uma noite nem por isso nos parece menos bela. Tampouco posso compreender melhor por que a beleza e a perfeição de uma obra de arte ou de uma realização intelectual deveriam perder seu valor devido à sua limitação temporal. Realmente, talvez chegue o dia em que os quadros e estátuas que hoje admiramos venham a ficar reduzidos a pó, ou que nos possa suceder uma raça de homens que venha a não mais compreender as obras de nossos poetas e pensadores, ou talvez até mesmo sobrevenha uma era geológica na qual cesse toda vida animada sobre a Terra; visto, contudo, que o valor de toda essa beleza e perfeição é determinado somente por sua significação para nossa própria vida emocional, não precisa sobreviver a nós, independendo, portanto, da duração absoluta.
   Essas considerações me pareceram incontestáveis, mas observei que não causara impressão quer no poeta quer em meu amigo. Meu fracasso levou-me a inferir que algum fator emocional poderoso se achava em ação, perturbando-lhes o discernimento, e acreditei, depois, ter descoberto o que era. O que lhes estragou a fruição da beleza deve ter sido uma revolta em suas mentes contra o luto. A idéia de que toda essa beleza era transitória comunicou a esses dois espíritos sensíveis uma antecipação de luto pela morte dessa mesma beleza; e, como a mente instintivamente recua de algo que é penoso, sentiram que em sua fruição de beleza interferiam pensamentos sobre sua transitoriedade.
   O luto pela perda de algo que amamos ou admiramos se afigura tão natural ao leigo, que ele o considera evidente por si mesmo. Para os psicólogos, porém, o luto constitui um grande enigma, um daqueles fenômenos que por si sós não podem ser explicados, mas a partir dos quais podem ser rastreadas outras obscuridades. Possuímos, segundo parece, certa dose de capacidade para o amor – que denominamos de libido – que nas etapas iniciais do desenvolvimento é dirigido no sentido de nosso próprio ego. Depois, embora ainda numa época muito inicial, essa libido é desviada do ego para objetos, que são assim, num certo sentido, levados para nosso ego. Se os objetos forem destruídos ou se ficarem perdidos para nós, nossa capacidade para o amor (nossa libido) será mais uma vez liberada e poderá então ou substituí-los por outros objetos ou retornar temporariamente ao ego. Mas permanece um mistério para nós o motivo pelo qual esse desligamento da libido de seus objetos deve constituir um processo tão penoso, até agora não fomos capazes de formular qualquer hipótese para explicá-lo. Vemos apenas que a libido se apega a seus objetos e não renuncia àqueles que se perderam, mesmo quando um substituto se acha bem à mão. Assim é o luto.
   Minha palestra com o poeta ocorreu no verão antes da guerra. Um ano depois, irrompeu o conflito que lhe subtraiu o mundo de suas belezas. Não só destruiu a beleza dos campos que atravessava e as obras de arte que encontrava em seu caminho, como também destroçou nosso orgulho pelas realizações de nossa civilização, nossa admiração por numerosos filósofos e artistas, e nossas esperanças quanto a um triunfo final sobre as divergências entre as nações e as raças. Maculou a elevada imparcialidade da nossa ciência, revelou nossos instintos em toda a sua nudez e soltou de dentro de nós os maus espíritos que julgávamos terem sido domados para sempre, por séculos de ininterrupta educação pelas mais nobres mentes. Amesquinhou mais uma vez nosso país e tornou o resto do mundo bastante remoto. Roubou-nos do muito que amáramos e mostrou-nos quão efêmeras eram inúmeras coisas que consideráramos imutáveis.
   Não pode surpreender-nos o fato de que nossa libido, assim privada de tantos dos seus objetos, se tenha apegado com intensidade ainda maior ao que nos sobrou, que o amor pela nossa pátria, nossa afeição pelos que se acham mais próximos de nós e nosso orgulho pelo que nos é comum, subitamente se tenham tornado mais vigorosos. Contudo, será que aqueles outros bens, que agora perdemos, realmente deixaram de ter qualquer valor para nós por se revelarem tão perecíveis e tão sem resistência? Isso parece ser o caso de muitos de nós; só que, na minha opinião, mais uma vez, erradamente. Creio que aqueles que pensam assim, e parecem prontos a aceitar uma renúncia permanente porque o que era precioso revelou não ser duradouro, encontram-se simplesmente num estado de luto pelo que se perdeu. O luto, como sabemos, por mais doloroso que possa ser, chega a um fim espontâneo. Quando renunciou a tudo que foi perdido, então consumiu-se a si próprio, e nossa libido fica mais uma vez livre (enquanto ainda formos jovens e ativos) para substituir os objetos perdidos por novos igualmente, ou ainda mais, preciosos. É de esperar que isso também seja verdade em relação às perdas causadas pela presente guerra. Quando o luto tiver terminado, verificar-se-á que o alto conceito em que tínhamos as riquezas da civilização nada perdeu com a descoberta de sua fragilidade. Reconstruiremos tudo o que a guerra destruiu, e talvez em terreno mais firme e de forma mais duradoura do que antes.

1 de novembro de 2012

"A tristeza é Azul" - Anotações da palestra de Marcus Quintaes


   Meu intuito não é expor um resumo ipsis litteris das reflexões feitas por Marcus Quintaes na palestra "A tristeza é azul: notas arquetípicas sobre a melancolia". Meu interesse é apenas compartilhar (e, acima de tudo, organizar internamente!) algumas impressões, expor as marcas impressas em minha subjetividade pelo "enfoque cromático" de certos estados psíquicos (depressão, tristeza, melancolia, apatia, desespero, inanição...). Conciderá-los como portadoras de uma  "tonalidade azul" nos permite compreender que são, antes e para além da abordagem redutiva dos diagnósticos, situações inerentes à alquimia exsitencial.   
   Vale ressaltar que é impossível arrolar todas as interessantes ideias com as quais entrei em contato. Algumas (sobretudo aquelas referentes à alquimia), não serão mencionadas por exigirem maiores elaborações que tornariam o texto muito denso. Listo apenas aquelas que chamaram mais a minha atenção, ideias que puderam se ligar com outras já pré-existentes e que, por isso mesmo, ecoaram em mim. São como ideias-sementes que foram lançadas em terrenos já conscientes e que, portanto, são passíveis de germinar e brotar, agora, em palavras...     
   Vamos ao que interessa: às impressões
 - Podemos pensar a depressão como uma espécie de homogeneização de estados psíquicos distintos. Em baixo “do guarda-chuva depressão” encontramos inúmeras condições psíquicas que não podem ser reduzidas ao diagnóstico patologizante conhecido como depressão. As consequências dessa generalização são a medicalização e os esforços contínuos para extirpar todo e qualquer sentimento “não alegre”.
- Vivemos sob a égide de uma cultura performática, hedonista, competitiva, imediatista, consumista e, principalmente, perversa. Sua crueldade consiste no fato de que ao mesmo tempo em que rejeita a letargia, a tristeza, a depressão, a apatia, a dúvida, a melancolia (a lista é grande!), ela é mestra em gerar em nós (com todas as suas exigências, protocolos e receitas prontas para o sucesso) todos esses sentimentos/estados/sensações tidos como indesejáveis, inadequados e contraproducentes. Essa contradição é responsável por muitos conflitos intrapsíquicos e interpessoais.
- A tristeza é, em si, uma condição existencial não patológica. Tanto a alegria quanto a tristeza são “personagens” no palco da vida e ambas merecem seu devido reconhecimento. Apesar da aceitação e enfrentamento da tristeza não serem encorajados por nossa cultura unilateral (onde só há espaço para o belo) o esforço legítimo não deve ser o de eliminá-la automática e drasticamente toda vez em que entra em cena. O mais sensato é buscar formas de afirmar a vida apesar de sua tragicidade. E uma delas (que encontra no setting terapêutico um lugar privilegiado) é ir em busca das imagens da tristeza. Ao invés de fugir, buscar um relacionamento com essas imagens numa tentativa de individuá-las, ou seja, de conduzi-las a um estado de maior diferenciação e consciência. (Para os não familiarizados com o conceito junguiano de individuação vale, em caráter propedêutico, ler a breve descrição do Wikipédia  ou ainda a do Dicionário Crítico de Análise Junguiana).
- Nesse sentido, cabe ao analista se questionar o quanto é capaz de suportar a tragicidade das histórias que batem a sua porta, o quanto é capaz de receber o trágico sem se coadunar ao imediatismo de soluções e o amortecimento da dor por vias alienantes, tão caras à nossa sociedade. O convite analítico é o de descer ao mundo subterrâneo para possivelmente se reerguer com uma maior compreensão, seja do sofrimento em questão ou do fato de que as chagas são intrínsecas à condição humana  O pedido (do) inconsciente do analisando é, como cantou Nelson Cavaquinho, o de que tiremos o nosso sorriso (muitas vezes amarelo e “chocado”) do caminho para que ele possa passar com a sua dor. E passar, é o verbo exato!
   Essas são apenas algumas reflexões suscitadas pela palestra e mais desdobramentos ainda virão!
   Finalizo citanto Connie Zweig e Jeremiah Abrams (em "Ao Encontro da Sombra"). São palavras que vão ao encontro do exposto aqui e na palestra:
   "A depressão também pode representar uma confrontação paralisante com o lado escuro, um equivalente moderno da 'noite escura da alma' do místico. Nossa exigência interior para que desçamos ao mundo subterrâneo pode ser suplantada por considerações de ordem externa (como a necessidade de trabalhar por longas horas), pela interferência dos outros ou por drogas antidepressivas que amortecem a nossa sensação de desespero. Nesse caso, deixamos de apreender o propósito da nossa melancolia" (p.18)