Este é um espaço para a reflexão de temas que em algum momento e por alguma razão (do meu contexto pessoal ou da minha prática clinica) se tornaram, usando uma expressão gestáltica, importantes FIGURAS no imenso FUNDO existencial.

12 de maio de 2013

Dia das Mães

Mãe Divina, Grande Mãe, Arquétipo da Mãe, constelação do complexo materno e seus diferentes efeitos no filho e na filha... não, não quero falar da mãe arquetípica, muito menos do que pode dar errado nessa relação que todas as psicologias, sem excessão, concluiram ser fundamental. Em Sobre os filhos já teci, inspirada em Khalil Gibran, algumas dessas reflexões "psicopatológicas" e aos interessados em conhecer um pouco mais da perspectiva junguiana a respeito da influência da mãe sobre seus filhos, recomendo "Aspectos psicológicos do arquétipo materno" no volume "Os arquétipos e o inconsciente coletivo", da obra de Jung.

Também não quero falar da mãe que "é tempo sem hora, luz que não apaga quando sopra o vento e chuva desaba" (Carlos Drummond de Andrade). Não é da mãe "sobre-humana" que a "tudo dá um jeito" e que nunca falha ou que não pode nem se quer morrer! É claro que compreendo a beleza do sentido de eternidade dado à mãe por Drummond; mas não são os poetas (homens!), imbatíveis nos seus mais belos enaltecimentos da "imagem da mãe", que hoje falam à minha alma.

Quero, no meu terceiro Dia das Mães, contemplar a "mãe real", de carne e osso, de Luz e Sombra... E encontro na "Carta ao meu filho" de Isabela Crema, um texto demasiadamente humano, e que talvez por isso mesmo me pareceu divino e digno de ser compartilhado no dia de hoje!

 
Filho

Quero, antes de qualquer coisa, agradecer-te.
Agradecer-te por ter-me escolhido para ser sua mãe, dentre milhões de outras possibilidades.
Quero agradecer por ter chegado e virado minha vida de cabeça pra baixo, revelando o que há de melhor em mim...
Agradeço por revelar-me o oceano de Amor que habita minh’alma...
...por mostrar-me o encanto do desabrochar da vida e da consciência dentro dos seus olhos profundos, desde o primeiro instante em que saíste de dentro de mim...
...por inundar-me de um Amor tão puro e transbordante com seus sorrisos, seus trejeitos, suas graças e conquistas diárias rumo a liberdade à ti destinada.
Agradeço por fazer-me exercitar a musculatura da paciência dentro de mim, fazendo com que eu me torne, a cada dia, uma pessoa mais forte, mais tolerante e, portanto, melhor.

Filho, agradeço-te por ter virado minha vida de cabeça pra baixo e revelado o que de pior há em mim...
Compreendi, com sua chegada, que os filhos vêm do tamanho exato da nossa ferida e chegam para nos brindar com a oportunidade de lapidarmo-nos, de transformar e limpar a sujeira que jaz na mais profunda escuridão do nosso ser.
Agradeço por mobilizar-me diariamente com dificuldades que  trazem à tona tantas dores, tantos pactos, tantos sentimentos ocultos, negados ao longo de toda uma vida e, assim, dar-me a oportunidade diária de lançar LUZ sobre a minha sombra e dar passos concretos rumo à cura de minhas feridas.
Filho, agradeço-te por me brindar com a coragem de olhar para isso tudo e seguir no meu caminho de transformação me mostrando, na doçura do teu olhar e na pureza dos teus gestos, que eu posso ser, hoje,  uma pessoa e, logo, uma mãe melhor do que a que fui ontem.

Te agradeço, filho, e também te peço perdão...
Te peço perdão por cada vez que minhas dores me cegaram nos momentos de cansaço...
... por cada vez que te tratei como uma criança que não sabe o que quer e tomei decisões que não levavam em  consideração o seu desejo, a sua emoção, os seus sentimentos.
...por cada vez que o cansaço me consumiu e eu deixei-me anestesiar com atividades que me tornaram indisponíveis para você, mesmo estando dentro da mesma casa, da mesma sala...
...por cada vez que fui incapaz de decifrar a sua dor e a rotulei de manha e de chatice...
...por cada vez que fui incapaz de ler os teus sinais e acabei por exceder os seus próprios limites. Os seus e, também, os meus.
Peço perdão, filho, por tantos erros cometidos e por tantos erros que ainda cometerei, pois, filho, devo lembrar-te que escolheste uma mãe humana.
Uma mãe humana, cheia de defeitos e limitações...
Mas pode confiar filho! Escolheste uma mãe humana que, além de tantas contradições e limitações, tem também uma sede profunda pela transformação. 
Uma mãe cujo desejo de curar suas feridas e se tornar uma pessoa a cada dia melhor arde na alma e no coração...
Irei te decepcionar muitas vezes, filho... mas uma coisa posso prometer-te, meu amor... prometo-te estar sempre à caminho do meu ser real que é capaz de acolher-te e amar-te totalmente!

Filho amado do meu coração! Te agradeço, te peço perdão... e também te peço paciência.
...peço sua paciência pois sei que nascestes milhões de anos luz à minha frente e sei que vens de uma Tribo que vibra um som muitas oitavas acima da minha capacidade.
Peço sua paciência pois sei que tenho algumas coisas a te ensinar, mas sei também que tu tens um Universo inteiro a descortinar  diante dos meus olhos encantados e mareados de emoção...
Peço sua paciência, filho, pois desejo ser capaz de aprender tudo aquilo que o brilho do profundo dos teus olhos me anunciam.

E peço ao Universo, meu Amor, que eu saiba adubar bem a terra em que você se plantou com respeito total, conexão, justiça e nutrição... que eu saiba regar a sua terra com água cristalina, pura, límpida, refrescante e fluida, repleta de sentimentos e emoções verdadeiras... que eu saiba deixar passar toda a LUZ necessária para fazer brotar sua semente plenamente, para despertar, à cada dia, o teu ser e a tua missão... que eu saiba permitir que os ventos e os vendavais da vida cumpram sua missão de esculpir o seu ser, sem cair na armadilha da superproteção que sufoca e faz morrer a criatividade e a espontaneidade que tanto amo em ti.

Eu peço ao Universo, meu amor, que eu saiba, neste mundo de tanta concretude e concreto, ajudá-lo a manter os seus canais de comunicação com os anjos e as fadas, com os teus guias e aliados, com a beleza vibrante da vida e todas as formas de expressão do Grande Mistério nesta vida terrena, sempre limpos e livres para expressarem-se da forma que tiver de ser.

Eu te AMO, filho... e agradeço-te, do fundo da minha alma, por fazer-me reconhecer a fonte de amor que há em meu coração e por inundar-me diariamente com o ímpeto de fazer esta fonte jorrar e transbordar o meu ser.

Que eu saiba honrar tudo o que és...
Que eu saiba honrar tudo o que sou...
Que eu saiba honrar tudo o que somos...  
...agora e sempre...

"Nada posso lhe oferecer que não exista em você mesmo. Não posso abrir-lhe outro mundo além daquele que há em sua própria alma. Nada posso lhe dar, a não ser a oportunidade, o impulso, a chave. Eu o ajudarei a tornar visível o seu próprio mundo, e isso é tudo." 
Herman Hesse

Isabela Crema, 10/05/2012

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